sábado, setembro 13, 2008

Yesterday

Ontem.
Ontem eu me senti bem e me senti mal.
Ontem eu quis ter o mundo.
Ontem eu senti o vazio que existe em mim.
Ontem eu vi o abismo.
Ontem eu me desesperei.
Ontem eu me acalmei.
Ontem eu quis você e te contei.
Ontem eu fui consolada.
Ontem eu chorei.
Ontem eu sorri.
Ontem eu escrevi uns versos.
Ontem eu quis morrer.
Ontem eu quis nascer, viver.
Ontem eu fui desacreditada.
Ontem eu falei a verdade.
Ontem eu ignorei o que estava errado.
Ontem eu fingi.
Ontem eu me machuquei, não só fisicamente.
Ontem eu senti que você é meu.
Ontem eu quis continuar.
Ontem.

segunda-feira, junho 30, 2008

Vida dupla

E assim eu vou vivendo, sem saber quem sou ao acordar ou pra que direção devo ir.
Todo dia encarno vários alguéns, e no final não sei mais quem eu sou.
Simplesmente não sei quem sou.
Não sei.

A louca

Quando ela passa: - a veste desgrenhada,
O cabelo revolto em desalinho,
No seu olhar feroz eu adivinho
O mistério da dor que a traz penada.

Moça, tão moça e já desventurada;
Da desdita ferida pelo espinho,
Vai morta em vida assim pelo caminho,
No sudário de mágoa sepultada.

Eu sei a sua história. - Em seu passado
Houve um drama d’amor misterioso
- O segredo d’um peito torturado -

E hoje, para guardar a mágoa oculta,
Canta, soluça - coração saudoso,
Chora, gargalha, a desgraçada estulta.

(Augusto dos Anjos)

domingo, junho 29, 2008

Desespero

Hoje, eu chorei aquelas lágrimas que roubei de você, no tênue fio da navalha que enxugou seu rosto delineado de uma boneca, misturadas ao sangue que lhe tirei à força.
Lembrei, então, do seu desejo de que eu brincasse com você.
Depois de te beijar.
Depois de te lamber.
Depois de te bater.
E depois de te usar, para manter minha existência infame.
Senti o seu desespero correndo pelas minhas veias, ao perceber como fui capaz de desacreditar o seu sonho infantil.
A sua angústia passou pelos meus olhos, no momento em que lhe traí.
E meu coração parou, no momento em que seu sangue envenenou o meu, quando lambi as suas lágrimas, que percorriam o meu rosto.

terça-feira, junho 24, 2008

Der Meister

É engraçado pensar que eu não lembro há quanto tempo ou como o conheci, mas eu acredito que foi há uns quatro ou cinco anos.
Como? Não lembro bem, mas envolvia o IRC, o MSN e talvez pessoas em comum, mas exatamente como, eu realmente não sei dizer.
Quando percebi, ele era uma pessoa essencial, talvez desde sempre, mas só enxerguei algum tempo depois.
Ele era meu Mestre, e sempre que precisava eu recorria a ele, e ele sempre me dava lições em busca de meu crescimento, ou não. Mas de certa forma ele me ajudou a crescer, a ser uma pessoa melhor.
Menti uma vez para poder vê-lo, e não me arrependi, porque existem pessoas, como o Mestre, que valem à pena.
Hoje ele apareceu e mandou que eu postasse algo, eu aleguei estar sem inspiração, e ele disse que não precisava... Mal sabe que resolvi escrever sobre ele.
Mestre, dia 1º ta chegando. O meu dia, e o seu também.
Tenho certeza que estas experiências vão trazer coisas boas para nós.
Boa viagem pra você, enquanto eu me viro com o terninho aqui.
hehehe

terça-feira, maio 20, 2008

Meme mandado

Meu querido Mestre resolveu me mandar este meme, já que roubei o anterior, então está aí.
Era pra escolher um artista/banda e responder as perguntas com os nomes das músicas dele.
Escolhi Cazuza.

1. Você é homem ou mulher?
Menina Mimada

2. Descreva-se:
Sem Conexão Com o Mundo Exterior

3. O que as pessoas acham de você?
Você Se Parece Com Todo Mundo

4. Como descreveria seu último relacionamento amoroso?
Não Há Perdão Para o Chato

5. Descreva sua atual relação com seu(sua) namorado(a) ou -pretendente:
Você Vai Me Enganar Sempre

6. Onde queria estar agora?
NUm Trem Para as Estrelas

7. O que pensa a respeito do amor?
O Amor é Brega

8. Como é sua vida?
Vida Louca Vida

9. O que pediria se pudesse ter apenas um desejo?
Incapacidade de Amar

10. Escreva uma frase sábia:
O Nosso Amor a Gente Inventa (Estória Romântica), O Tempo Não Pára

11.Despeça-se:
Lembre-se de mim

quinta-feira, maio 15, 2008

Elevador

Era uma quinta-feira. Uma quinta-feira normal demais, estranha demais. O sol não estava muito alto e o vento carregava as folhas das árvores, ventava muito.
Entrei pela portaria e segui direto, o porteiro já me vira o suficiente para decorar a minha expressão e lembrar que falar comigo não gerava um resultado muito amigável.
Apertei o botão para chamar o elevador e ajeitei minha saia enquanto esperava, as portas se abriram, entrei, apertei o sexto andar e encostei-me ao canto e fechei os olhos, elevadores sempre me deram um pouco de angústia.
O elevador parou no sexto andar, e as portas se abriram junto com meus olhos. Um rapaz alto, que usava um terno preto, esperava do lado de fora. Ele olhou pra mim com certa surpresa e sorriu, abrindo passagem para que eu pudesse sair. Não me movi.
— Não vai sair daí?
Meus lábios formaram um leve sorriso.
— Não, e você vai entrar?
— Vou, tenho que descer.
— Eu também.
Ele entrou no elevador e apertou o botão que indicava a garagem, encostou-se à parede ao meu lado e ficou me olhando.
— Hoje é meu aniversário.
Eu olhei pra ele séria.
— Quantos anos?
— Vinte e três.
Puxei-o pela gravata e o beijei, ele não tentou se afastar, e nos beijamos como se fizéssemos aquilo sempre, ou como se estivéssemos apaixonados. Deliciosamente apaixonados.
O elevador parou com aquele costumeiro bip. Estávamos na garagem, ele iria embora, e eu iria subir novamente para o sexto andar. Sozinha.
— Parabéns, isso foi o seu presente de aniversário...
Ele não disse nada, me deu um beijo rápido de despedida e saiu rumo ao seu carro. Apertei o sexto andar, peguei uma bala de gengibre na bolsa e subi novamente de olhos fechados.
Saí do elevador, abri a porta do 602 e entrei. A sala estava arrumada e sem ninguém como sempre, cheirava a jasmim. Eu odiava aquele cheiro, sempre fazia meu nariz coçar.
— Amor, você está aí?
Falei ligeiramente mais alto, e ele apareceu no final do corredor.
— Você está atrasada.
— Vi o teu irmão lá embaixo, saindo do elevador...
— E enrolou conversando com ele?
Ele falou com um leve tom de irritação que sempre me assustava.
— Não, ele só me falou que hoje era aniversário dele...
— Mentira, o aniversário daquele infeliz já passou.
Achei melhor não falar mais nada, larguei-me no sofá e fiquei ali olhando o tempo passar, mas ele parecia estar parado.

segunda-feira, maio 05, 2008

Mentiras (nada) Sinceras

"Nunca somos nós mesmos quando há platéia."

Tem uma série que eu assisto, onde a máxima do personagem principal é "Todo mundo mente", eu sempre concordei, e digamos que gosto de pensar sobre isto.
Por quê?
Porque as questões de mentira e verdade sempre me fascinaram, pois cada um tem a sua verdade e a sua mentira, cada um tem a sua moral e a sua fé.
É pessoal demais para se discutir, é pessoal demais para se entender.
Você entende apenas a sua visão, nunca a do outro. Muitas vezes você não entende nem mesmo a sua, mas gosta de fingir que entende a do outro.
Estranho, né?
Não tão estranho como o nosso dia-a-dia, que é repleto de atrizes e atores que nunca nem sonharam em aparecer na televisão ou subir num palco.
São atrizes e atores que nem mesmo se dão conta de que sabem atuar.
Todos nós temos nossa platéia pessoal, e estamos atuando o tempo inteiro, a diferença, a sutil diferença, é que a maioria das pessoas não percebe que está encenando.
A maioria das pessoas acredita que a mentira delas é a verdade alheia.
É aí que as mentiras passam a ser verdade, pois você acredita tanto naquilo, que não há quem duvide.
Mas, qual a diferença entre mentira e verdade?
Nenhuma.
É apenas uma questão de visão.
De ver o que você quer, e não o que é.

sábado, abril 26, 2008

A Ninfa

Previsível Egocêntrica Sexual Inexperiente (PESI)

Esperta. Sensual. Reservada. Um tanto diferente. Você é a A Ninfa.

Parece que você está procurando um PA (pau amigo) ou um relacionamento casual, mas o buraco é mais embaixo. Você tem fome, mas também é bastante cuidadosa, o que gera uma certa tensão sexual em você e em alguns relacionamentos. Em outros departamentos da vida, você consegue o que quer. Na vida amorosa, nem sempre.

É bem possível que você intimide seus potenciais candidatos. Mas o mais provável, porém, é que você seja um pouco introvertida – logo, misteriosa – e, naturalmente, as pessoas têm um pouco de dificuldade de lidar com isso. Talvez seja apenas parte do seu processo seletivo.

Você já teve relacionamentos suficientes para saber como se expor sem pressa.

Quando você se sentir confortável com alguém, no entanto, o seu ardente apetite sexual o fará muito feliz. A sua natureza cuidadosa também acaba sendo um curinga num relacionamento sério. Pode lever um certo tempo para o amor chegar, mas quando acontecer, será arrasador.

FUJA DOS TIPOS: The Falso Messias (PERE)
DÊ UMA CHANCE A: O Playboy (EGSE)
PERFIL OPOSTO AO SEU: A Princesinha (EGRE)

Link: O Teste de Personalidade OKCupid

Ps.: Eita falta do que fazer, hein?...

sábado, abril 19, 2008

Meu Eterno Estranho

Uma vez eu conheci um cara.
Não, não conheci de verdade...
Uma vez eu não conheci um cara.
Pensei que conheci, ou fingi que conheci.
Ele era um alienígena e me fez rir.
Eu era uma alienígena e gostei.
E no meio de palavras sem sentido, resolvi que era hora de fugir.
Aproximação demais é algo que me faz querer fugir.
E fugir é um impulso como o de piscar os olhos. Faço sem sentir.
Sem perceber.
Um dia eu descobri que todas as pessoas que eu conheço e não conheço ao mesmo tempo, todas as pessoas das quais eu tentei fugir, são estranhos pra mim...
Não as que ignorei, pois o meu ignorar é diferente do meu fugir.
E pessoas são pessoas, estranhos são o caso à parte.
Pois só os estranhos conseguem me ver.
O cara vai ser meu eterno estranho, pois ele foi o que mais me viu.
E não viu.
E viu.
Sem perceber.
Sem saber.
Odeio meus estranhos.
Amo meus estranhos.

segunda-feira, abril 07, 2008

Coisa à-toa

Aleatório
Banana
Chorar
Deixar
Esfinge
Fogo
Gostar
Homem
Irmão
Janela
Larissa
Menina
Nada
Olhar
Pensar
Querer
Rir
Sentir
Ter
Um
Você
Xadrez
Zeus

quarta-feira, março 26, 2008

Alicia

"Quand Alicia compose un bouquet des roses
Le monde est suspendu
Á ses lèvres et pour cause
Elles sont d'un rose
Inattendu
Quand Alicia s'endort, une plante carnivore
Veille sur son sommeil
Mais dans les bras de lierre d'Alicia
On ne se réveille pas
Alicia dort

Alicia dort
Un bouquet de violettes
Des serpents à sonnettes
Dansent dans sa tête
Mon doux venin
Une odeur de jasmin
Sur les joues pâles
D'une fille végétale
Quand Alicia compose
Un bouquet des roses
Le monde est suspendu
Mais dans les bras de lierre d'Alicia
On ne se réveille pas"






Alicia não é uma boneca. Nunca foi.
Ela é dotada de uma impulsividade desenfreada, age de acordo com o que sente e deseja.
Não é de ficar presa em uma caixinha de vidro, exposta ante os olhos alheios, tão curiosos e inquisidores.
Ela gosta de ser livre, gosta de respirar o ar puro e senti-lo na face.
Não da falta de ar dentro da caixa, pois não há por onde ele entrar.
Ela quer ver o mundo com seus olhos gulosos, que sempre estão roubando cenas e olhares, e querem sempre mais.
Não são os olhos de vidro de uma boneca, sempre tão vazios e fugazes.
Ela tem uma boca que sabe sorrir de verdade e de mentira, e que sabe se expressar.
Não uma boca que sempre traz um meio sorriso falso e não emite som algum.
Ela sente cada coisa da vida, e tão intensamente. Ela sente.
Não como a boneca que nada sente. Eu não sinto.
Ela é um anjo com as asas arrancadas.
Eu sou uma boneca quebrada.

sexta-feira, março 07, 2008

Fantasmas

Todo mundo tem os seus fantasmas, sabe? Eu tenho os meus.
E eles são fragmentos de um passado que já deixei para trás há um bom tempo.
Estes fragmentos formam um grande quebra-cabeça, pois estão interligados intrinsecamente um com o outro.
A imagem que eles formam?
Não sei.
Talvez um pesadelo, talvez um sonho.
Ou o nada concentrado que encontro nos abismos de minha mente enquanto durmo.

“Nenhum de nós é quem parecemos ser pelo lado de fora.Mas precisamos manter aparências para sobreviver.
[...]
Tirar uma vida conscientemente representa o desligamento definitivo com a humanidade.
Te transforma num estranho.
Sempre olhando os outros, procurando por companhias para manter."

E eu nunca parei de olhar, mas meus fantasmas sempre estavam ali para não me deixar ver.
Não de verdade...
Então, eu os matei.
Desliguei-me definitivamente da humanidade, e pude ver o mundo, observar as pessoas.
Tão falsas, abandonadas e frágeis.
Encontrei anjos, bonecas quebradas e estranhos.
Descobri que estranhos podem me ver, bem mais do que quaisquer outros.
E amo-os.

“Pode-se, às vezes, ver mais claro em quem mente do que em quem fala a verdade.
A verdade, como a luz, cega.
A mentira, ao contrário, é um belo crepúsculo, que valoriza cada objeto.”


E digamos que eu sou uma atriz, sei atuar, sei mentir, sei dissimular. O meu problema (ou não), é que eu faço isso o tempo inteiro.
E eu faço de minhas mentiras, a minha luz. A minha fonte inesgotável de vida.
Aquilo que me faz seguir adiante...
São mentiras sinceras.
Aquelas que só anjos loucos desamparados e estranhos são capazes enxergar.
Os meus estranhos.

sábado, fevereiro 23, 2008

Obsessão

O céu estava nublado, mas dentro daquela sala estava quente. Mais especificamente, abafado. Sentei naquele balcão, e minha saia subiu um pouco, as pernas ligeiramente abertas, brincando no ar, pois não alcançava o chão.
Ele olhou pra mim e riu.
Aproximou-se e veio ouvir o meu coração, mas por um breve momento fechou os olhos e suspirou profundamente.
Ele me abraçou e o mundo pareceu desmoronar a nossa volta, e eu quis ficar ali pra sempre, mas não durou mais que alguns segundos.
Sorri e fui embora.

terça-feira, fevereiro 19, 2008

Efeito Colateral

Tão logo, aonde chegamos?
Ao êxtase da descoberta.
“— Eureca!”.
Ao delírio, meus queridos botões...
Ao saber e não saber.
O tudo e o nada.
Convenhamos, qual seria a graça da vida, se não conhecêssemos os encantos da alucinação?
Aquela, tão majestosa e voluptuosa, que pode levar-nos à loucura ou à salvação!
Abençoada seja.

sábado, fevereiro 02, 2008

Meine L.

Estava sentada na areia, olhando os movimentos de ir e vir das ondas, um cachorro que brincava de pegar uma bola ali perto, os pequenos veleiros descansando no mar.

Ela sentou do meu lado e disse que nunca viu uma pessoa tão triste.

Olhei pra ela e vi uma mulher com algumas rugas de expressão, um sorriso sincero adornado por brincos demasiado grandes pro seu rosto. Logo pensei que ela fosse uma hippie, vendendo alguma pedrinha que me traria sorte. E era.

Ressaltando apenas que, ela conseguiu enxergar cada partícula de desespero contida em mim, e ansiava saber o que tornava meus olhos tão vazios.

E eu não pude lhe dizer. Eu não posso me dizer.

Ela continuou a sorrir, e me disse coisas como se me conhecesse há anos, eu fiquei assustada, mas concordei que ela tinha razão.

— Você ama uma pessoa tão intensamente, que dói.

— Como você sabe?

— Dá pra sentir.

— Vai parar de doer?

— Não. Você vai amar essa pessoa pra sempre.

— E o amor resiste à eternidade?

— Sim, essa pessoa vai sempre estar em sua vida. Seja nessa, ou nas outras que virão. E você sempre vai amá-la.

Então, ela me deixou ali, sentada na areia, vendo o mar, pensando naquilo que eu meio que já sabia.

Ela não perguntou o meu nome, e eu não perguntei o dela.

Lembrar-me-ei dela apenas como a vendedora hippie que não tentou me vender nada, mas viu o que não deveria.

Viu a mim, e não teve medo.

sábado, janeiro 05, 2008

Frontal com Fanta

Ela me perguntou quantas pessoas eu já vi morrer. Quantas pessoas você já viu morrer? Nenhuma, eu disse. Ela sorriu e disse eu vou ser a primeira. Eu disse vai. Ela disse boa sorte.

— Boa sorte.

E morreu. Os lábios dela continuavam vivos, vermelhos. Parecia que ela estava dormindo. Ela morreu e pronto. Era bom ficar olhando seu corpo, bonito. A enfermeira entrou, viu que ela tinha morrido e me disse para sair do quarto, chamou o médico, eu saí do quarto.

Uns dias depois o enfermeiro me disse que ela estava grávida. Ele disse também que achou melhor ela ter morrido, imagina ela com um filho.

Eu imaginei ela com um filho, um filho meu, e agarrei o enfermeiro pela garganta.

Dois enfermeiros correram e me seguraram e me deram uma injeção. Eu acordei amarrado e fiquei ali alguns dias. Eles mudaram meu remédio. Eu me lembrei que ela havia me pedido para ficar vivo pra me lembrar dela e resolvi não tomar o remédio, não tomar mais remédio nenhum. Passei mais seis meses na clínica, fingi que estava curado, saí, voltei a estudar. Fiz o supletivo do segundo grau, passei no vestibular, me formei, casei, tive um filho, me separei. Hoje trabalho nesta farmácia. Continuo vivo e me lembrando dela.

Eu não me lembro muito bem se tinha 13 ou 14 anos na primeira vez em que fiquei invisível. Eu acho que tinha 14, estava frio, devia ser inverno e eu faço aniversário no verão. Também podia ser no inverno antes de eu fazer 14, mas eu acho que não, porque a minha irmã já estava usando aparelho e estes dias eu perguntei e ela tem certeza que tinha dez anos quando começou a usar. É muito provável que eu já tivesse ficado invisível muitas vezes antes, tenho certeza que sim. Quando a minha mãe e o meu pai discutiam, quando ele gritou que ela é que quis ter filho e agora não gosta de ficar com as crianças e só quer viajar, quando ela bebia e andava quase nua pela casa, quando o meu irmão punha a mão nos peitos da namorada, quando o meu pai mudava a televisão de canal pouco antes do fim do filme que eu estava assistindo havia mais de uma hora, é claro que eu estava invisível, só que não percebia.

Eu estava na escola na primeira vez que percebi que estava invisível. O professor mandou todo mundo se apressar para o passeio. Eu demorei a me levantar juntando as coisas, todos saíram e o professor olhou para a sala, olhou na minha direção, apagou a luz, saiu e fechou a porta. Talvez eu tenha ficado invisível para não ir naquele passeio, não queria passar o dia vendo as meninas mais lindas me virando a cara, e todos aqueles meninos idiotas gritando e correndo e se batendo. Fiquei algum tempo parado, peguei minhas coisas e saí da sala. Caminhei pelo corredor, cruzei com alguns alunos, olhei bem para eles e eles não me viram. Saí do colégio e caminhei seis quadras até a minha casa, passando por muitas pessoas que não me viram. Entrei em casa sem ser visto, fui para o meu quarto.

Saí do quarto e minha mãe estava jantando, com minha irmã. Meu irmão mais velho vai chegar no próximo fim de semana e elas querem arrumar a casa. Ele vem com a namorada e vai dormir no meu quarto, eu vou dormir com a minha irmã, no chão do quarto dela. Elas falaram todo o tempo, decidindo o que ia acontecer comigo, sem me ver. Comi frango com arroz e legumes e fui ao banheiro. Abri o armário dos remédios, peguei um remédio da minha mãe, frontal. Li a bula. "Componente ativo: alprazolam. Indicado no tratamento de estados de ansiedade. Seu mecanismo de ação exato é desconhecido." Talvez fosse isso, ansiedade se cura com remédio. Não é recomendado a pacientes psicóticos. Os sintomas da ansiedade são: tensão, medo, aflição, agonia, intranqüilidade, dificuldades de concentração, irritabilidade, insônia e ou hiperatividade. Os sintomas da ansiedade sou eu. Peguei o vidro e fui para o meu quarto. Tomei dois, devia ter pegado água, não é bom tomar remédio com fanta. Deitei e dormi.

Acordei, era outra pessoa. E continuava invisível. Minha irmã, minha mãe e a empregada não me viram. Tomei café e mais um comprimido e fui para a escola caminhando sem ninguém me ver. Assisti às três primeiras aulas sem ser visto. Entendi tudo, anotei, gostei de estar aprendendo coisas. Estava feliz, feliz e invisível. No recreio fui até o banheiro e tomei outro comprimido.

Saí do banheiro, o sol batia no pátio, nos cabelos das meninas, nas pernas das meninas. Duas delas, das mais lindas, passaram na minha frente, entraram no banheiro. Entrei atrás delas. É claro que elas não me viram. Uma delas baixou a calcinha e sentou no vaso, mas não deu para ver nada, ela estava de saia. A outra abriu a blusa na frente do espelho e ficou ajeitando os peitos dentro do sutiã. Eu estava muito feliz de estar ali, pensei em gritar ou botar a mão nos peitos dela, mas ela ia levar um susto, achei melhor não. Elas falaram de uma festa e saíram sem me ver.

Passei o resto da semana invisível e feliz. Comecei a economizar os comprimidos, tomava três por dia, um antes de ir para a escola, outro depois do almoço, outro antes de dormir. Não sonhava com nada, acordava feliz. No sábado tinha a festa e eu estava louco para ir, invisível.
Levei o remédio para a festa para tomar um lá. Não conseguia entrar no banheiro das meninas, era muito apertado, mas escutei todas as conversas, histórias incríveis de quem deu ou queria dar para quem. Tomei dois comprimidos com vinho, vários copos de vinho. Resolvi entrar no banheiro das meninas, seguindo uma das mais lindas. Ela entrou, eu entrei junto. Ela tirou a blusa e tirou da bolsa um desodorante roll-on. Começou a passar desodorante, erguendo os braços e se olhando no espelho, muito linda, a coisa mais linda que eu já tinha visto. Não consegui me controlar e lambi seu braço.

Ela deu um grito, começou a me bater, gritar. Abriu a porta, gritando, um monte de gente veio correndo, o pai dela, o namorado dela, todos começaram a me bater enquanto ela gritava que eu tinha entrado no banheiro e lambido ela e todos me batiam. Aparentemente minha invisibilidade tinha passado, talvez por causa da lambida. A mãe dela, que me conhecia, me ajudou a levantar do chão. Ficou me olhando, assustada. E aí eu vomitei.

Quebrei dois dedos da mão esquerda, acho que foi um dos chutes. Todos em casa me viram, me olharam muito bem. Meu pai olhava para mim com medo, minha irmã com nojo e minha mãe chorava.

Meu irmão chegou com a namorada, ninguém disse nada para ela que eu era um drogado e maníaco sexual. Minha irmã não quis me deixar dormir no chão do quarto dela e eu dormi uma semana na sala, no sofá. Dormia ouvindo meu irmão e a namorada trepando no meu quarto. Um dia acordei e fiquei parado, no escuro. Ela passou pela sala só de calcinha, ótimos peitos, bunda boa. Voltou da cozinha e ficou parada no meio da sala, tomando água no bico da garrafa, sem me ver. Me levantei e fiquei olhando para ela, ela não me viu. Eu estava invisível outra vez. Me aproximei e toquei no peito dela. Ela deu um grito.

Me levaram num médico que me disse que eu precisava aprender a relaxar e outras coisas que eu já sabia e me receitou paxon. Li a bula. Princípio ativo: cloridrato de buspirona. Agente ansiolítico indicado no alívio a curto prazo dos sintomas da ansiedade e da apreensão, do medo e dos maus pressentimentos. Era o meu caso. Cinco a dez miligramas duas vezes por dia. Perfeito. Não estava mais invisível mas continuava feliz.

Mudei de escola e passei o resto do ano feliz. No final do ano fiquei preocupado com as provas e com as festas e comecei a tomar três comprimidos por dia, às vezes quatro. Às vezes tomava com vodca, nas festas. Depois comecei a tomar também o frontal da minha mãe, ela descobriu e escondeu no armário. Achei e tomei. Meu pai disse que ia me internar, minha irmã disse que eles deviam chamar a polícia.

O médico cortou o ansitec e me deu valium. Li a bula. O princípio ativo do valium é o diazepam. Indicado para distúrbios emocionais, especialmente ansiedade, e distúrbios comportamentais, como a má adaptação social. Agora sim. Um antes de dormir, às vezes dois.

Um dia eu tomei dois no almoço, com cerveja, e depois fui para o supermercado. Tinha uma menina, bonitinha, acho que com menos de três anos, no corredor dos biscoitos. Ela pegou um pacote grande de biscoitos, quase maior que ela, e tentou botar no carrinho. A mãe estava falando no celular e não viu. Ela chamava, mãe, mãe, bicoito, mãe, mãe. A mãe caminhava pelo corredor e falava no celular, discutia com alguém sobre prazo de entrega, horário de entrega de alguma coisa. A menina tentava botar o pacote, não alcançava no carrinho. O pacote caiu no chão, a mãe empurrou o carrinho que passou por cima do pacote. A menina se desequilibrou e caiu sentada no chão. A mãe gritou, disse que a menina tinha derrubado tudo no supermercado, desligou o celular e começou a gritar com a menina, que começou a chorar. A mãe viu os biscoitos quebrados, botou na prateleira, ergueu a menina pelo braço e continuou gritando enquanto ela chorava. Eu me aproximei, queria estar invisível. Não estava, a mulher olhou para mim e perguntou o que foi. Eu dei um soco no rosto dela, acho que acertei a boca e o nariz. Ela caiu, gritando de dor. A menina começou a gritar e a chorar. Tinha sangue na minha mão, não sei se meu ou dela. A mulher me olhava, apavorada, gritando e tapando o nariz e a boca com a mão. Ela viu sangue na mão dela e começou a gritar, a menina chorando. Um casal saiu correndo, algumas pessoas se aproximaram. Um garoto de uniforme me olhou com medo. Um segurança se aproximou, me olhando e falando num rádio.

Um segurança do supermercado me deu um tapa na cabeça. Me assustei, mas não doeu muito. Um policial veio e foi embora. Meu pai chegou, muito nervoso. Pediu desculpas para todo mundo, disse que eu era doente. Olhei para o meu pai, sofrendo, triste, tentando não aparentar toda a tristeza que realmente sentia, com vergonha de imaginar uma parte dele em mim, e tive certeza de que ele estava falando a verdade, eu era doente mesmo.

Meu pai, minha mãe e meu irmão sugeriram que eu fosse internado, ficasse um tempo numa clínica. Achei ótimo, eu não queria mais ficar olhando para as pessoas que estavam sofrendo por minha causa. Meu irmão me ajudou a fazer a mala. Meu pai me deu um beijo, fazia muito tempo que eu não via ele tão feliz. Minha mãe chorou um pouco mas também estava feliz. Só quem parecia triste era a minha irmã. Eu disse que ia me tratar e ia voltar logo. Ela perguntou se podia pegar o meu videogame, eu disse que sim.

Eu falei com um médico e com uma médica. Contei de tudo, dos remédios e do fato de eu ficar invisível. Eles me disseram que eu nunca fiquei invisível e eu acabei concordando. Ele perguntou se eu tinha tremores, dor ou tensão muscular, se eu me irritava ou ficava nervoso com facilidade, se eu sentia as mãos frias e pegajosas, se às vezes eu tinha dificuldade para engolir, sentia aquele nó na garganta, se às vezes sentia a boca seca, suor, enjôo ou diarréia. Eu disse que tinha tudo, menos diarréia. Ela perguntou se eu ficava muito preocupado com as minhas notas na escola ou num jogo de futebol, se eu me preocupava muito em chegar na hora, se costumava chegar muito cedo nas festas, se eu me preocupava com terremotos ou com a guerra, se eu costumava refazer uma coisa muitas vezes, até achar que estava perfeito, se eu costumava perguntar para as pessoas se o que eu fiz estava bem-feito ou não. Eu respondi sim para tudo, menos para a guerra.

Eles tinham certeza de que eu era um sessenta ponto seis, personalidade ansiosa. Eles me disseram que os sintomas da personalidade ansiosa são um sentimento de tensão constante, um sentimento de insegurança e inferioridade, um desejo permanente de ser amado, de ser aceito, hipersensibilidade à crítica e à rejeição, uma dificuldade ou desconforto para encontrar pessoas ou para sair da rotina, sempre com medo que aconteça alguma coisa de ruim.

É perfeito, é exatamente isso. Finalmente eu encontrei alguém que descobria o que eu tinha. Só que eles tinham dúvidas se a minha ansiedade era generalizada e já se manifestava na infância, ou se era induzida por substância. A ansiedade induzida por substância surge com a intoxicação ou a abstinência. A ansiedade primária, que vem da infância, pode provocar o uso da substância. Enfim, eles tinham dúvidas se eu era louco porque me drogava ou me drogava porque era louco. Perguntaram se eu tinha ataques de pânico ou alguma fobia. Contei da vez que eu ataquei a menina no banheiro da festa, da namorada do meu irmão e do soco na mulher no supermercado, mas isso eles já sabiam. Eles conversaram um pouco e concordaram que eu devia tomar nervium. Princípio ativo: bromazepam. Indicado para distúrbios emocionais, tensão nervosa, agitação e insônia, ansiedade e humor depressivo ansioso. É exatamente o meu caso, humor depressivo ansioso.

Antes de sair da clínica e encontrar meus pais e minha irmã, e todo mundo ficar feliz por eu fingir tão bem que estava curado, eu achei um disquete no lixo da clínica. O ferrinho do disquete estava um pouco torto mas eu trouxe para casa e um dia consegui abrir dois arquivos. Um era uma tabela, sem graça. O outro tinha várias anotações, nenhuma sobre mim. Todas eram parecidas.

J.S. estava aparentemente saudável. H.M.C tinha o comportamento normal. T.H.N vinha aparentemente bem. J.M.R. havia começado a ingerir álcool combinado com o uso de codeína (xarope para tosse) três anos antes da primeira hospitalização. N.T. vinha apresentando alterações do comportamento social associado à ingestão progressiva de álcool desde quatro anos antes da primeira hospitalização. Oito semanas antes da internação, ela fez uso de amineptina com álcool pela primeira vez. O paciente M.C.S. usou cannabis durante dois anos. O paciente N.G.F. mostra o semblante apreensivo. A paciente M.F, cuja mãe é esquizofrênica, vinha consumindo cannabis e, ocasionalmente, diazepam com álcool há três anos. O paciente B.T. vinha consumindo ecstasy regularmente durante dois anos e, ocasionalmente, cocaína. Uma grave perda da capacidade de conviver socialmente foi a causa de sua internação. A paciente D.J. teve alucinações auditivas importantes seguidas de delírios. Gesticula muito ao falar. Olhar triste. Uma grave disfunção cognitiva foi percebida pelos pais da paciente, que encaminharam a internação. Segundo a mãe do paciente, dois meses antes de ser internado o filho apresentou idéias paranóides e uma importante perda de função intelectual. Gesticula muito ao falar. Não consegue se concentrar. Quatro dias antes da hospitalização, ela tomou um comprimido de certralina associado com álcool e cannabis e apresentou imediatamente delírios e alucinações auditivas. Tomou LSD por um ano antes de ser hospitalizado. Não consegue ficar parado, gesticula muito ao falar. Ouvia vozes imperativas. Alucinações auditivas, delírios e disfunção cognitiva, percebida por seus pais. Esses sintomas persistiram durante nove meses e cessaram espontaneamente. Não tem energia para nada. Ao narrar suas brigas com a mãe, fica exaltada, com o olhar brilhante. Experimentou cogumelos alucinógenos. Afirma que não confia na namorada e que seu maior desejo é desmascará-la. Tem delírios e alucinações permanentes. Seis meses antes da internação, fez uso de LSD. Gesticula muito ao falar. Medos difusos e delírios culminaram com sua hospitalização. A partir daí, houve uma mudança em seu comportamento caracterizada por uma perda de sociabilidade seguida da presença de delírios, segundo declarações dos pais da paciente. Tem um olhar triste, perdido. Um dia antes de ser internada experimentou cocaína pela primeira vez. Um mês antes da internação, ela começou a ter idéias paranóides e hiperatividade motora. Tem a testa franzida, o olhar baixo, as mãos crispadas. Cinco semanas depois da ingestão de drogas, ela apresentou delírios paranóicos persistentes. Mostra-se muito aflito e exaltado durante a consulta. No dia da hospitalização, apresentava alucinações visuais. O uso de hipofagin com álcool culminou com delírios, alucinações e comportamento agressivo em relação aos pais. Gesticula muito ao falar. Foi observada uma diminuição de sua capacidade intelectual com problemas de concentração, segundo os pais da paciente. De acordo com os pais do paciente. Descrito pelos pais do paciente. Os pais do paciente.

São eles que pagam as contas e limpam a sujeira. São eles que pagam para você ficar longe, normal. Um dia meus pais conversaram com os médicos e eles me mandaram para casa. Provavelmente acharam que eu era um efe treze ponto oito, transtorno de ansiedade induzido por ingestão de sedativos, hipnóticos ou ansiolíticos. Eu podia ir para casa, provavelmente não ia sujar nada nem atacar ninguém. Estava curado. Precisava estudar, cuidar da vida, me concentrar. Foi o que eu fiz.

Jorge Furtado

sexta-feira, janeiro 04, 2008

Amoodeioamoodeioodeioamo

Amor e ódio, o que são?
Não sei dizer, pois talvez eu nem saiba o que é o amor, o que é amar, ou odiar.
Acho que tenho uma perspectiva bem deturpada em relação a estes sentimentos, mas vejo-os caminhando juntos.
De mãos dadas.
Dedos entrelaçados.
Unidos até o fim, inseparáveis.
Não se pode odiar uma pessoa que você nunca amou.
Não se pode amar uma pessoa sem odiá-la, mesmo que sejam em ínfimos momentos.
E as pessoas seguem acreditando que o amor e o ódio são opostos, enquanto eles são gêmeos idênticos.
Separam-se gêmeos?
E o que dizem sobre eles terem uma ligação única, compartilharem sentimentos?...
O amor e o ódio se comportam assim: sendo o porto-seguro um do outro.
Se eu não te amo mais, eu te odeio.
Não! Não! Não!
Se eu te odeio, eu te amo.
Eternamente...
Só vou ser capaz de odiar uma pessoa que eu amar!
Por quê?
A linha tênue que separava os dois, nunca existiu.
Nunca!
Ódio e amor, o que são?
São sentimentos intrínsecos um do outro.